“Mesmo quando as dúvidas nos atormentam, mesmo quando não conseguimos ver o caminho nem prever consequências, ainda assim continuamos adiante. Imprevistos podem e irão surgir, mas a criatividade necessária para os superar pode levar-nos a encontrar novas paisagens, ainda que estas não sejam visíveis imediatamente. Mais à frente, quando o nevoeiro levantar, vamos perceber o tanto que andámos e todas as coisas novas que descobrimos pelo caminho.” Escrevi o parágrafo de cima no texto sobre a última Lua Nova, a de Peixes, mas na altura desconhecia ainda a dimensão e os contornos concretos do que aí vinha. Agora, com a nossa sociedade em isolamento compulsivo, estamos todos a ser obrigados a encontrar novas formas de trabalhar, novas formas de nos relacionarmos e novas formas de usar os nossos recursos. Estamos todos a aprender a cultivar a nossa autonomia e a dependermos menos de certos serviços que, afinal, percebemos serem supérfluos, mas também a tomar consciência de como estamos todos tão mais ligados do que pensávamos. Um vírus que começou na China e que achámos que nunca chegaria à Europa está agora espalhado pelo mundo inteiro. A próxima Lua Nova acontece nos 4° do signo de Carneiro, amanhã de manhã, terça-feira dia 24, às 9h28, hora de Lisboa, 6h28, em Brasília. Carneiro é o signo dos inícios, ele inicia o ano zodiacal e traz consigo a Primavera do hemisfério Norte, o renascimento da natureza e a força necessária à vida. Esta Primavera vai ser inevitavelmente diferente, porque a energia de confinamento e introspecção, natural do Inverno, vai arrastar-se por mais algum tempo. Mas também porque esta Primavera marca um ano de viragem, o ponto zero de uma nova era, o início de uma nova vida. Lua e Sol entregam-se nas mãos do Quíron, que conhece bem o sofrimento e que, precisamente por isso, se tornou um curador. Nós estamos em sofrimento, mas não é por estarmos fechados em casa. Estamos em sofrimento porque, enquanto sociedade, nos apegamos de forma doentia ao consumo, às coisas e à imagem. Premiamos comportamentos individualistas e alienados e assim fomos criando uma desconexão de nós mesmos, do colectivo e da natureza. Estamos em sofrimento porque somos adictos, viciados em consumos tóxicos que nos tapam os vazios da alma. Mas Quíron, além do sofrimento, também traz a cura. E esta paragem pode ser bastante reveladora para cada um de nós e de certeza que o será para o colectivo. Estamos a perceber onde nos dói, o que nos provoca dor, ansiedade e angústia e é precisamente aí que está a cura, no reconhecimento e na aceitação do sofrimento. Só depois de realmente entendermos o que nos dói e porque dói é que estaremos prontos para nos curarmos. Quíron em Carneiro mostra-se como o individualismo cego e o egoísmo doente ou, em contraste, como a incapacidade, o desconhecimento da própria força e a dificuldade em tomar iniciativa. O texto da Lua Nova em Peixes termina com a frase “Somos menos do que pensamos e mais do que acreditamos.” O nosso egocentrismo gosta de nos ver separados, isolados e mais do que os outros, mas não somos nada disso. Somos todos feitos de carne, de ossos e de sangue, todos mortais. E a nossa sensação de impotência também é falsa porque, quando nos ligamos à nossa essência e vivemos com consciência todas as nossas dimensões, deixamos de ser um só e tornamo-nos grandes, maiores do que acreditámos ser possível. Logo a seguir a Quíron e também no papel de curadora, está Lilith, a Lua Negra, a força feminina e selvagem da Terra. Ela é visceral, crua, instintiva e primitiva, ela é o lado animal que gostamos de esquecer que ainda existe em nós. Lilith é a própria Natureza, pura, forte e inexorável. Ela é a nossa natureza primordial, a nossa Mãe mais antiga, e exige respeito. Nós, enquanto sociedade, temos feito de tudo para a ignorar e agora a Mãe chegou ao seu limite e mandou-nos a todos para o quarto de castigo, como li algures nas redes sociais. O nosso medo do desconhecido faz-nos desconfiar da Natureza, faz-nos pensar que que é ela perigosa e traiçoeira e que temos que a controlar e corrigir. Na verdade, ao querer dobrar a Natureza segundo a nossa vontade, estamos a ofendê-la, a feri-la e a violentá-la. E o que fazemos todos os dias, de forma cada vez mais sistemática, mais grosseira e mais cruel, à Mãe Natureza, fazemos a nós mesmos, ao nosso corpo, às nossas emoções e a toda a Humanidade. Nas próximas semanas, enquanto te estiveres a adaptar às novas circunstâncias, sente-te. Sente como estão as tuas emoções, como está o teu corpo. Consegues verdadeiramente parar? Ou precisas do ruído à tua volta ou de algum outro tipo de escape? De que emoções queres fugir? Depois de as reconheceres, dá-lhes um pouco de espaço. É ok se não te sentires bem e o medo, a ansiedade ou a impaciência são normais em fases de mudança. Podes também reconhecer outras emoções mais positivas que coabitam com as emoções difíceis. É importante aceitá-las todas, as “boas” e as “más”. Fingir que não sentimos o que sentimos é o princípio da dissociação e foi isso que nos trouxe até aqui. Seja o que for que sentes, aceita, liga-te à tua respiração e reconecta-te com a tua essência. Define o teu contorno interno e separa-te do barulho das luzes com que és assediada constantemente. Separa-te do lado de fora, da sociedade e das expectativas dos outros, e liga-te do lado de dentro, à tua essência, à Humanidade e à Vida.
6 Comentários
Luís Salomé
23/3/2020 12:22:35
Olá Bárbara,
Responder
Bárbara Bonvalot
25/3/2020 16:18:34
É isso, Luís :)
Responder
Ângela
24/3/2020 20:48:18
Obrigada por compartilhar seu saber
Responder
Bárbara Bonvalot
25/3/2020 19:49:24
Obrigada pelo interesse, Ângela :)
Responder
Maria Rosmaninho
4/4/2020 18:20:41
Muito bons os seus artigos. Fazem todo o sentido...
Responder
Bárbara Bonvalot
4/4/2020 20:09:31
Obrigada, Maria. É bom tê-la por aqui :)
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