Cinderella, autor desconhecido, edição George Reutledge and Sons (1865)
A rapariga humilde e sacrificada, que cumpre todas as suas tarefas com dedicação e zelo e no fim se transforma na mais bela princesa é o conto perfeito para ilustrar a energia de Virgem, o signo do serviço, da modéstia, da higiene e do refinamento. Esta história é tão popular que tem versões, adaptações e variantes em todos os formatos que podemos imaginar, desde as várias narrativas orais e literárias, passando pelo teatro e pelo cinema, até à ópera e ao ballet. A versão de Charles Perrault, editada em 1697 no livro Histórias da Mãe Gansa, é provavelmente a mais conhecida nos dias de hoje. No entanto, a história publicada pelos irmãos Grimm em 1812, na primeira edição do seu conhecido livro de contos, é bem mais rica em detalhes e acredito que mais próxima do imaginário tradicional.
Nesta versão dos irmãos Grimm, a jovem protagonista fica órfã de mãe logo no início da história e o seu pai não demora muito para voltar a casar. A nova família, a madrasta e as suas duas filhas, ao invés de acolher a menina, menospreza-a e diminui-a à condição de criada. Virgem é um signo de Terra, é prático e focado naquilo que é concreto e real. Ao contrário do signo que lhe precede, Leão, as pessoas com esta energia muito presente no seu mapa natal são reservadas, humildes, gostam de se sentir úteis e prestáveis e sentem-se bem nos bastidores, e saber qual é a sua função no esquema geral da coisas. No seu lado sombra, este signo tem tendência a sentir-se vítima das circunstâncias, sem poder nem vontade própria, escravo de uma situação que acredita não controlar, como a jovem deste conto.
Confinada à cozinha, onde nem sequer tem uma cama para se deitar, a rapariga é obrigada a dormir na chaminé para se aquecer e, por essa razão e para aumentar a afronta, as irmãs chamam-na Gata Borralheira. Assim como a humildade é uma das melhores qualidades de Virgem, a crítica e a humilhação representam o seu lado negativo. No entanto, Cinderella (o nome da protagonista na versão de Perrault) não se queixa nem faz exigências e, tal como o signo de Virgem, ela aceita obedientemente a sua sorte.
Por cima da campa da sua mãe, a rapariga planta uma árvore que rega com as suas lágrimas, tal é o seu sofrimento. A árvore cresce e três vezes por dia a Gata Borralheira ali vai para chorar e rezar, cumprindo, mesmo que inconscientemente, um ritual de limpeza emocional e espiritual ao libertar desta forma a sua dor e a sua frustração. De todas as vezes vem também um pássaro branco que, sempre que Cinderella pede alguma coisa, lhe concede o desejo. Daqui podemos depreender que os sonhos da rapariga são modestos e nada ambiciosos, ou ela já se teria libertado da sua escravidão. Também isto é muito virginiano, a moderação e a cautela, mas, no seu lado mais pesado, a falta de confiança em si mesmo e a crença de que não merece mais do que aquilo que tem.
Cinderella, autor desconhecido, edição George Reutledge and Sons (1865)
Um dia o rei anuncia uma grande festa que durará três dias e na qual o príncipe escolheria a sua noiva. As irmãs de Cinderella logo começam com os preparativos, no que a pobre rapariga é obrigada a ajudá-las, sabendo que ela própria não poderá ir ao palácio. Aqui, pela primeira vez no conto, é-nos revelada uma aspiração da Gata Borralheira, ir ao baile e viver o seu sonho de perfeição. Mas ela não é perfeita, não tem as roupas certas, nem sabe dançar e a madrasta proíbe-a de ir à festa, pois iria envergonhá-la e às suas filhas. Perante a insistência de Cinderella, a madrasta deita um prato cheio de lentilhas nas cinzas da lareira e diz-lhe que, se ela conseguir apanhar as lentilhas em duas horas, poderá ir ao baile. A Gata Borralheira vai ao jardim e chama a pomba e todos os outros pássaros para a ajudar. As aves vão bicando grão a grão e apanham todas as lentilhas em menos de uma hora. A condição que a madrasta impõe a Cinderella é uma tarefa bastante virginiana. Para separar as lentilhas das cinzas, que é como quem diz separar o trigo do joio, é necessário usar as qualidades de discriminação e atenção ao pormenor, tão próprias deste signo, assim como a capacidade de não desanimar perante um trabalho que nos parece repetitivo e monótono. Virgem pertence também ao modo mutável e consegue adaptar-se eficientemente a qualquer função que precise de desempenhar, sabendo escolher a ferramenta e o método mais adequados. Mercúrio, o planeta dos processos mentais, é o regente deste signo inteligente e racional e ajuda-o no seu trabalho de análise, triagem e separação, em direcção ao aprimoramento e depuração da matéria. Depois de cumprida a tarefa, a madrasta, decidida a impedir que Cinderella vá ao baile, repete o desafio, duplicando a dificuldade. Mais uma vez o trabalho é executado competentemente com a ajuda dos seus amigos alados. Os pássaros são uma presença constante nas várias versões deste conto, mas é comum encontrarmos também ratos, lagartos e, na versão de Walt Disney, ainda um cão e um gato. Em épocas não tão remotas assim, os animais domésticos tinham funções específicas na casa e eram uma grande ajuda, quer fosse como fornecedores de alimento, como guardas contra os intrusos ou como caçadores de ratos. No mapa natal eles estão incluídos no simbolismo da casa 6, a casa que tem afinidade com o signo de Virgem. Ainda assim, a madrasta não permite que a rapariga vá ao baile. Apesar de humilde e obediente, este signo também é determinado e, mal todos saem, a Gata Borralheira vai até árvore, onde o pássaro lhe dá um lindíssimo vestido, todo em prata, e uns sapatinhos de seda e prata. Rapidamente ela se troca e segue para a festa. Durante toda a noite o príncipe não dança com mais ninguém, até que Cinderella quer voltar para casa. O príncipe insiste em acompanhá-la pois quer saber onde ela mora e quem ela é, mas, ao chegar ao pé de casa, a rapariga escapa-se e esconde-se. Na noite seguinte acontece a mesma coisa. Na terceira noite, ao fugir a jovem perde um dos seus sapatinhos, desta vez feitos do mais puro ouro, nas escadas do palácio. Virgem é metódica e perfeccionista, cautelosa e prudente, e poucas vezes se arrisca, com demasiado receio de dar um passo em falso e de falhar. Na verdade, Cinderella, apesar dos vestidos de prata e sapatos de ouro, acredita que será sempre a humilde e suja Gata Borralheira e prefere não alimentar expectativas que crê serem irrealistas. Este signo é por natureza desconfiado e inseguro e o seu nível de autocrítica é tal que muitas vezes é-lhe difícil acreditar que pode ser amado, apesar de todos os seus defeitos ou, mais inverosímil ainda, que alguém possa amar as suas imperfeições. Virgem é também discreta e estanque e esta divisão entre dois mundos não é estranha a estes nativos, que muitas vezes mantêm a sua vida privada bem separada da sua vida social ou profissional. No entanto, ela deixa para trás o sapato, como se quisesse estabelecer um elo entre as suas duas vidas para que elas se possam encontrar e ela possa voltar a ser uma só.
Cinderella, autor desconhecido, edição George Reutledge and Sons (1865)
O príncipe vai até a casa da família de Cinderella tendo como única pista o sapatinho. Primeiro vem a irmã mais velha experimentá-lo, mas como o dedo grande não cabe, a conselho da mãe, ela corta-o. Assim que consegue encaixar o pé mutilado no sapato, ela sai com o príncipe para se tornar a sua mulher. O pássaro, o leal ajudante da Gata Borralheira, avisa o filho do rei desta fraude e ele volta para trás, reclamando que esta não é a sua verdadeira noiva. Depois vem a segunda irmã que, para calçar o delicado sapato, se vê obrigada a cortar o calcanhar e novamente o príncipe, prevenido pelo pássaro, volta para trás para devolver a falsa esposa. Estas automutilações lembram-me um lado menos saudável de Virgem, a incessante procura de uma perfeição inalcançável. Esta busca pode tornar-se tão extrema ao ponto de estas pessoas se tornarem obsessivas com a sua imagem, assumindo um controlo demasiado agressivo sobre o seu corpo, através de dietas e regimes de emagrecimento ou de intervenções e cirurgias estéticas. Um exemplo disto é o virginiano Michael Jackson. Quando o príncipe pergunta ao pai de Cinderella se não havia mais nenhuma jovem na casa, ele responde: “Há apenas a coitadinha da Gata Borralheira, filha da minha primeira mulher. Mas ela não pode ser a noiva…” O final da história é conhecido, o sapatinho serve que nem uma luva no pé da rapariga e ela e o seu amado vivem felizes para sempre. Apesar do cepticismo do pai, que simboliza a autoridade e o condicionamento social, a nossa consciência, o Sol, representado pelo príncipe, sabe reconhecer o brilho e a essência de Cinderella, mesmo quando ela está coberta de cinzas, ou seja, mesmo por trás de todos os seus defeitos e de todas as suas imperfeições. Através deste conto, o signo de Virgem ensina-nos que o caminho para perfeição não é feito olhando para a meta ou com a expectativa de ganhar o prémio da felicidade máxima quando formos lindos, impecáveis ou imaculados. A perfeição é uma rotina e um hábito. A perfeição é sermos úteis e servirmos algo maior do que a nós mesmos. A perfeição é alcançada todos os dias, sempre que pomos toda a nossa dedicação e todo o nosso amor em cada passo que damos, em cada tarefa do quotidiano e em cada detalhe da nossa vida.