
A primeira coisa em que pensei quando li o tema foi em Kali, a deusa hindu. Mas, aparentemente, Kali não tem nada a ver com a maternidade. Kali é a deusa da morte e da destruição, ela mata tudo o que é mau, ruim e pernicioso para que haja espaço para o novo, o fresco e o bom. Ela é, se quisermos, um “mal necessário”. Lembro-me que quando a conheci, já não me lembro bem como, me identifiquei imediatamente com Kali. Gostei da deusa forte e poderosa que exerce o seu poder de forma radical e assertiva. Gostei da ideia da destruição que não é gratuita e cega, mas que tem o propósito de abrir espaço, de limpar. Acho que a palavra certa é “purgar”.
Mas o que é que Kali tem a ver com a maternidade? A maternidade de Kali é ao contrário, inversa à outra maternidade, ela não tem o poder da criação, o seu poder é o da destruição. Kali é toda força e não pede licença. Logo a seguir identifico a minha mãe, sempre lhe reconheci uma grande força. Mas não é a minha mãe que é Kali. A mãe Kali sou eu.
E agora ocorre-me se, com esta identificação, não estou eu também a destruir esse outro poder em mim, se não estou a eliminar as questões da maternidade, da gestação e da vivência de um feminino mais produtivo, do feminino da abundância e da fertilidade. Mas será que não posso viver os dois papéis como mulher? Ser uma força destruidora e ser uma força criadora, alternando entre estes dois estados, num constante processo de auto-renovação e auto-reinvenção.
Talvez seja esta a minha forma de dar à luz. A Morte e a Imperatriz, no Tarot. O Escorpião e o Touro, na Astrologia. E percebo que estou a dar à luz de mim própria, morrendo e renascendo, ciclicamente.
24 de Maio de 2015